JOSÉ MANOEL DA SILVA
DATA E LOCAL DE NASCIMENTO: 2/12/1940, município de
Toritama – PE.
FILIAÇÃO: Luiza Elvira da Silva e Manoel José da Silva.
ESTADO CIVIL: casado.
ATUAÇÃO PROFISSIONAL: cabo da Marinha, fabricante de
calçados artesanais e comerciante.
ORGANIZAÇÃO POLÍTICA: Vanguarda Popular Revolucionária
(VPR).
DATA E LOCAL DA MORTE: entre 8 e 9/01/1973, no Sítio São
Bento, em Paulista – PE.
CODINOMES: Cirino, José Mané, Gordo.
Relator: Manoel Moraes. Sub-relatores: Humberto Vieira, Gilberto Marques.
BIOGRAFIA
Natural de Toritama, em Pernambuco, José Manoel da Silva alistou-se na
Marinha, em 1960, e serviu em Natal (RN). Era cabo quando participou do movimento
dos marinheiros e de manifestações no Sindicato dos Metalúrgicos, no Rio de Janeiro.
Foi excluído dos quadros da Marinha em 1964, após o golpe militar.
Retornou para Natal e, posteriormente, para Toritama, no interior de
Pernambuco, onde trabalhou como taxista e almoxarife até abrir seu negócio próprio,
um comércio de calçados. A partir de contatos com ex-companheiros das mobilizações
dos marinheiros, então engajados na luta contra a ditadura, José Manoel ingressou na
VPR. Atuava na região onde residia como suporte para a organização da guerrilha. Era
casado com Genivalda Melo da Silva, com quem teve três filhos: Auro Vladimir, Ana
Valéria e Andréa Virgínia. Vivia legalmente com sua família, tendo domicílio e local de
trabalho conhecidos, em Toritama.
O sequestro de José Manoel da Silva
José Manoel da Silva foi sequestrado quando se encontrava em um posto de
gasolina, no município de Toritama (PE), em 7 de janeiro de 1973, pela manhã.
Amarrado, foi levado por policiais à paisana em uma viatura do INCRA ao Sítio de São
Bento, em Abreu e Lima, na época distrito de Paulista, onde foi torturado e morto no dia
8 ou no dia 9 do mesmo mês.
A esposa de José Manoel da Silva, Genivalda Melo da Silva, com quem teve três
filhos, foi presa algum tempo após a morte do marido. Na ocasião, foi brutalmente
torturada e seviciada sexualmente por quatro agentes do DOPS, tendo em decorrência
engravidado; o que lhe teria levado posteriormente a um aborto feito em precaríssimas
condições de higiene e saúde.
Genivalda declarou, em depoimento à CEMVDHC, em 19 de dezembro de
2013, no Auditório da Associação dos Docentes da Universidade Federal de
Pernambuco, que mesmo em liberdade, após a sua prisão, continuou sendo perseguida
por policiais federais em Natal-RN, onde passou a residir com seu pai. Por várias vezes,
sequestraram-na e a levaram, à força sob mira de armas, para motéis onde fora
novamente estuprada, sob ameaça de ter os três filhos assassinados. E isso aconteceu em
plena transição democrática, nos marcos da Constituição de 1988. Suas denúncias de
sevícias físicas e sexuais expõem o caráter brutal das violências e das manipulações a
que chegaram a ser submetidos os familiares das vítimas, mesmo com o fim da ditadura.
Foi muito difícil eu ter perdido meu marido na situação em que ele morreu. Morreu como
um terrorista perigoso, covarde, bandido, e o maior bandido disso tudo, vocês vão me
desculpar, foi o cabo Anselmo, que era o maior amigo. Eu conheci o cabo Anselmo no
tempo em que meu marido era militar da Marinha em Natal, e depois eu não tive mais
contato com o cabo Anselmo. Vim ter contato com o cabo Anselmo quando eu morava em
Toritama e ele chegou com a Soledad lá em casa, em minha casa […]
Quando [refere-se a José Manoel] chegou no posto deram ordem de prisão, amarraram ele,
jogaram no carro do INCRA, e levaram […] A polícia federal entrou, eles quebraram tudo
dentro da minha casa. Olhe, eles rasgaram colchão, eles fizeram miséria dentro da minha
casa.[…] E passou no outro dia, já surgiu a morte dele rasgada, na televisão. Passou tudo. E
eu fiquei feito uma louca, sem marido, com três filhos pra criar, sem saber os motivos da
morte dele, por que eu não sabia nunca que meu marido estava envolvido com esse negócio
de Organização. […]
Aí, quando houve a morte, eu fui procurar os meus direitos e fiquei vindo aqui no Recife de
dois em dois meses, eu pagava o coveiro, mandei botar uma cruz com o nome dele […] aí o
coveiro me falou que eles iam queimar os ossos dele. Aí eu fui num barraco lá perto,
comprei dois sacos plásticos, dois panos de chão, uma garrafa de álcool […] E nisso eu
enterrei os ossos dele debaixo desse pé de fruta pão. […]
depois do acontecido a polícia me pegou, eu fui estuprada […] tive que fazer um aborto,
jamais eu teria condições de ter esse filho num estupro de quatro homens, que eles queriam
que eu dissesse quem eram os amigos de meu marido, mesmo sabendo do cabo Anselmo eu
nunca entreguei ninguém, eu não sabia realmente o que tinha acontecido com eles, só sabia
que meu marido tinha morrido num tiroteio. E aí fiquei grávida e nos quatro meses eu tive
que abortar esse filho […] E a perseguição deles foi muito grande comigo, porque eles me
perseguiram até 89. […] até 89 me perseguiram. Botaram um delegado do DOPS pra morar
na minha rua
José Manoel nunca informou sua esposa sobre as suas atividades na VPR e, com
isso, preservou-lhe a vida.
Quanto ao sepultamento de José Manoel da Silva, Genivalda Melo da Silva disse
em depoimento a CEMVDHC que quando tomou conhecimento do local onde tinha
sido enterrado o corpo do marido, dirigiu-se ao Cemitério da Várzea, no Recife. Foi
informada pelo coveiro, Otoniel Soares da Silva, que José Manoel havia sido enterrado
como indigente, com cinco cadáveres. Dois anos depois, Genivalda conseguiu retirar os
ossos do marido daquela cova comum. Seus ossos, colocados em sacos plásticos, foram
sepultados junto a uma árvore na entrada do cemitério. Vinte e dois anos depois, em
dezembro de 1994, com a ajuda do Movimento Nacional de Direitos Humanos e do
Movimento Tortura Nunca Mais e do governo do estado de Pernambuco (administração
Miguel Arraes), através da SEJUDH, os restos mortais de José Manoel da Silva foram
oficialmente identificados, entregues à família e conduzidos para sepultamento
definitivo em Toritama, no ano de 1995.