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ENTREVISTA COM JORGE BARRETT PARTE 2
No dia 16 de novembro de 2008 fui procurado por Jorge Barrett, irmão de Soledad e sobrevivente da chacina ocorrida em Pernambuco onde morreram seis militantes da Vanguarda Popular Revolucionária – VPR.
Na ocasião gravei uma longa entrevista com o Jorge. Segurei durante esses três anos e quatro meses esse material arquivado em fitas K7 por achar que a entrevista tem algumas falhas técnicas e revelações polêmicas. Porém, às vésperas da instalação da Comissão da Verdade julgo ser importante divulgar a entrevista com o irmão de Soledad Barrett.
“Minha primeira viagem ao Recife foi em 8 de março de 1972 e fui recebido na rodoviária por Soledad e An selmo. Nessa época eu tinha 21 anos”
“Havia constantes conversas telefônicas entre Soledad e Onofre Pinto”.
“Em Pernambuco o nome de guerra de Soledad era Lita”
“A pedido de Anselmo e Soledad fui cobrir um ponto na praia de Boa Viagem. Era pra receber Pauline e Eudaldo e fomos fotografados por pessoas que estavam num Fusca azul”
“Pauline e Eudaldo moravam no Sítio de São Bento, em Abreu e Lima”
“Eu e minha mulher, (Maria Dilênia Valença) morávamos na mesma casa onde morava Anselmo e Soledad, nos fundos da Butique Mafalda, no bairro de Varadouro, Olinda. Mais tarde a butique foi fechada e fomos morar num apartamento em Rio Doce, bairro de Olinda, a 100 metros da praia.
“Anselmo levou eu e Leninha pra pedir a Dom Helder autorização para nosso casamento. Porém, Dom Helder disse que não aprovava as condições de nosso casamento”
“Nós não tínhamos nenhum tipo de desconfiança de Anselmo “
“Todos que saiam da casa tinham que ligar a cada hora”
“Levei três rolos de filmes 135 mm de Olinda para o Chile. Eram cartas de Anselmo para Onofre Pinto”
“As cartas enviadas para Onofre eram a defesa de Anselmo diante das acusações de que ele era um infiltrado na VPR”
PARA ENTENDER O CASO
Os textos entre aspas são de autoria de Augusto Buonicore, historiador, mestre em ciência política pela Unicamp. E os que estão entre parênteses são de autoria de Aluízio Palmar.
“Anselmo foi enviado para São Paulo indo residir com o ex-marinheiro Edgard de Aquino Duarte. Este havia abandonado a militância clandestina e mantinha sua antiga amizade com Anselmo. O principal dirigente da VPR no Estado era Yoshitane Fujimore. Providencialmente, no dia 5 de dezembro de 1970, Yoshitane e o ex-marinheiro Edson Quaresma foram metralhados pela polícia política. Essas mortes abriram o caminho de Anselmo para a direção regional e nacional da organização. Um posto estratégico para missão que deveria cumprir.
(Antes de ir cobrir o “ponto” com Anselmo, Quaresma e Fujimori se encontraram com Paulo Medeiros, militante histórico do PCB do Rio Grande do Sul e posteriormente MNR e VPR. Na ocasião disseram ao Paulo Medeiros que estavam indo se encontrar com o cabo Anselmo.AP)
Logo em seguida, a VPR seqüestrou o embaixador da Suíça. Em troca exigiu a libertação de 70 presos políticos e distribuição de passagens gratuitas nos trens no Rio de Janeiro, além de divulgação de um manifesto. As negociações com a ditadura foram difíceis e duraram vários dias. (…)
Este, por sinal, foi um dos últimos atos de Lamarca como comandante da VPR. Ele defendia um recuo nas ações armadas urbanas e concentrar esforços na montagem da guerrilha rural. Em fevereiro de 1971, Lamarca e outros companheiros abandonaram a VPR e se integraram ao Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8). Um novo obstáculo era eliminado do caminho de Anselmo. Durante a luta interna escreveu o documento “Quem samba fica, quem não samba vai embora”. O texto dirigia-se contra aqueles que defendiam recuar da luta armada nas cidades. Estas atitudes não parecem típicas de um homem que estava começando se arrepender de sua opção política. Esta foi a justificativa que ele deu para a sua traição.
Em maio de 1971, outro dirigente da VPR, Aluísio Palhano, foi preso e brutalmente torturado pelo delegado Fleury. Depois foi entregue ao Centro de Informação do Exército onde, possivelmente, foi assassinado. Quaresma e Palhano eram amigos de Anselmo e haviam treinado com ele em Cuba.
Aqui a história se complica. Anselmo, em momentos diferentes, dá versões conflitantes sobre a sua mudança de posição: de guerrilheiro a alcagüete da polícia. Num depoimento ele diz que, após a morte do Fujimori, Quaresma e Palhano, decidiu espontaneamente entregar-se ao delegado Fleury. Levado ao DOPS paulista, aceitou, sem nenhuma coação, a condição de informante e depois infiltrado nas organizações revolucionárias.
Existe também uma outra versão. No dia 29 de maio ele fora entregar um embrulho a capitã do time de basquete feminino. No saguão do hotel, a vista de todos, fez questão de declarar: “Entregue isso ao companheiro Fidel. Ele saberá quem o enviou”. Um ato surrealista numa situação em que os dirigentes da VPR estavam sendo sistematicamente presos e mortos. Era óbvio que a delegação cubana devia ser vigiada permanentemente pelos órgãos de repressão. Em razão disso Anselmo e Edgar, seu companheiro de moradia, foram presos. Edgar passaria por diversas prisões até, finalmente, ingressar na lista dos desaparecidos políticos.
(Conforme informações de um ex-oficial de inteligência da Marinha, que não quer se identificar o cabo Anselmo já colaborava com o Cenimar desde a “Revolta dos Marinheiros” AP)
Pouco tempo depois Anselmo já estava de volta às ruas e tinha um apartamento – montado pelo DOPS. Este era uma verdadeira arapuca para os revolucionários que se encontravam com Anselmo. Em julho um grupo a Ação Libertadora Nacional (ALN) havia sido emboscado pela polícia após terem tido uma reunião com ele. José Raimundo da Costa, dirigente da VPR, foi preso e assassinado sob torturas em 5 de agosto de 1971. Ainda neste mês desapareceram Paulo de Tarso Celestino e sua companheira Eleni Guariba. O primeiro pertencia à ALN e a segunda à VPR. Todos havia tido encontros recentes com Anselmo.
A militante Inês Etienne Romeu conseguiu enviar uma mensagem ao Chile, onde se encontrava parte da direção da VPR, com as informações sobre Anselmo recebidas na prisão. Alertava que ele havia sido preso e, possivelmente, estaria colaborando com a repressão. Esta mesma advertência foi feita pela direção da ANL. A cúpula da VPR já estava muito dividida e alguns achavam que esta seria mais uma manobra usada na luta interna.
Declarou Anselmo: “Chegamos a um momento em que os “cabeças” (…) haviam saído para o Chile (…) Fiz a proposta: olha eu vou para o Chile e entro em contato com Onofre Pinto. Lá vou ter informação do que vem por aí. O Fleury concordou e a operação foi feita”. Em outubro, Anselmo apareceu no Chile. Já sob suspeição, ele foi defendido por Onofre Pinto, líder da VPR, que buscou colocar uma pá de cal no caso e chegou mesmo a enviá-lo de volta ao país para preparar uma base guerrilheira no nordeste. Para ali seriam enviados novos militantes que faziam curso em Cuba. Preparava, assim, o último ato da tragédia.
(Em outubro de 1971, cabo Anselmo surge no Chile, busca José Duarte e pede contato com a VPR. Duarte então buscou Ubiratan Vatutin que preparou o encontro entre Onofre Pinto e Anselmo. Apesar das informações chegadas no Chile, das evidências de que o cabo era alcagüete, Onofre considerou que tudo não passava de intrigas da luta interna e envia Anselmo para Pernambuco, onde havia uma base da VPR. Antes, deveria encontrar-se com Soledad, que estava em São Paulo, e levá-la para Olinda, onde alugariam uma casa e morariam juntos, dando uma aparência de casal. AP)
Ao voltar ao Brasil encontrou-se com Fleury na fronteira com o Brasil. Ali mesmo passou todos os planos da VPR. Tempos depois afirmou Anselmo: “Abriu-se uma das páginas finais do movimento guerrilheiro no Brasil. Eu estava no comando. Fleury podia acompanhar passo a passo uma das últimas tentativas de exacerbação da violência guerrilheira”.
Com Anselmo havia um outro agente infiltrado que era conhecido pelos guerrilheiros como César. Na verdade César era o policial Carlos Alberto Augusto, mais tarde promovido a delegado. O pessoal da VPR foi voltando do treinamento em Cuba e se integrando à região. Entre seus membros estavam a paraguaia Soledad Barrett Viedma, Eudaldo Gomes da Silva, Jarbas Pereira Marques, Evaldo Luís Ferreira de Souza e a tcheca Pauline Reichstul. Soledad era companheira de Anselmo e passaram a viver juntos em Olinda.
(…) “
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