Forças Armadas VPR

Documentos do IML de Pernambuco sobre a morte de José Manoel da Silva

José Manuel da Silva

Militante da VANGUARDA POPULAR REVOLUCIONÁRIA da(VPR).

Nasceu em 2 de dezembro de 1940, em Toritama, Pernambuco, filho de José Manuel da Silva e Luiza Elvira da Silva.

Ex-cabo da Marinha, expulso em 1964.

Foi assassinado sob torturas pela equipe do delegado Sérgio Fleury no dia 8 de janeiro de 1973, no Massacre da Chácara São Bento. Os detalhes desse massacre estão na nota referente a Eudaldo Gomes da Silva.

Em 19 de dezembro de 1994, sua viúva Genivalda Maria da Silva exumou seus restos mortais.

À época da morte de José Manoel, Genivalda também foi presa, torturada e estuprada por soldados do Exército. Ficou, então, sem coragem para reclamar o corpo do marido. Só agora, com o apoio do Grupo Tortura Nunca Mais de Pernambuco, ela tomou a iniciativa de exumar seus restos mortais e dar-lhe uma sepultura digna.

Depoimento de Mércia Albuquerque acerca

do massacre da granja São Bento

Eu MÉRCIA DE ALBUQUERQUE FERREIRA, casada, advogada, com identidade de n.º 388.849-SSS/PE, residente a Rua Sete de Setembro n.º 197/52 – Boa Vista, Declaro que: Jarbas Pereira Marques não era um desocupado como na época se dizia.

Ele trabalhou na Livraria Ramiro Costa, foi admitido em 02.12.71, como auxiliar de balcão, depois trabalhou na Livro Sete Ltda, como balconista, depois trabalhou na Livraria Moderna da Rede de Cassimiro Fernandes em 73 onde foi preso, três dias antes da prisão , Jarbas, ele procurou-me a noite e entregou fotografias da família, uma fotografia que dizia ser o Cabo Anselmo, Carteira do Trabalho, Certidão de Casamento, Certidão de Nascimento e Certificado de Reservista, que estava para ser preso e me disse que Fleury se encontrava no Recife com a sua equipe, e que o Cabo Anselmo usava os nomes de Daniel, Jadiel, Américo Balduíno, era companheiro de Soledad, mas ele já havia descoberto que esta pessoa era infiltrado na organização daí porque ele estava muito assustado, porque ele já havia conversado com Ayberé Ferreira de Sá e este fora preso, conversado com Martinho Leal Campos e este fora preso e com José de Moura e Fontes que fora preso também e com outras pessoas que ele não citou os nomes na hora que ele estava vivendo momentos de muita angústia e amargura porque ele não tinha pessoalmente nada haver com estas prisões. Jarbas era um tipo romântico ingênuo e eu conversei com ele que fugisse ao que ele se negou dizendo que isso não faria pela segurança da filha e da esposa, eu pei que ele deixasse a criança sob meus cuidados ele me falou que não ia levar Tércia Rodrigues para uma aventura porque ela era uma pessoa frágil e seria também assassinada aí era pior porque a menina ficaria órfã, quando foi no dia 08.01.73, a mãe dele chegou muito aflita ao anoitecer e me disse que ele teria sido retirado por dois homens da Livraria, a Livraria ficava situada na Rua Ubaldo Gomes de Matos, 115, ela focou toda noite na minha casa em estado de ansiedade muito grande, no outro dia pela manhã mandei uma pessoa, uma amiga minha, ir até a Livraria no sentido de comprar um livro do curso primário, a pessoa comprou e lá obteve a mesma informação que ele teria saído com dois homens, a tarde eu voltei para trocar o livro dizendo que o menino teria levado da primeira série mas o livro era da segunda e perguntei ao balconista por Jarbas, ele repetiu a história eu botei o retrato que eu tinha em mãos sobre o balcão e perguntei foi este o homem? Porque se foi este o homem eu acho que não há problemas me parece que é parente dele, o rapaz me respondeu foi este o homem e não tinha cara de amigo, eu voltei e comecei a busca e não estou assim muito segura se foi no dia 09 ou no dia 10 que tomei conhecimento que seis corpos se encontravam no necrotério, que nessa época funcionava em frente ao Cemitério de Santo Amaro, na praça, consegui a licença para entrar e ao entrar encontrei seis corpos realmente, em um barril estava Soledad Barret Viedma, ela estava despida tinha muito sangue nas coxas, nas pernas e no fundo do barril onde se encontrava também um feto.

Eu fique horrorizada, como Soledad estava em pé com os braços ao lado do corpo eu tirei a minha anágua e coloquei no pescoço dela, era uma mulher muito bonita, e estava também deitada numa mesa a Pauline, eu então cobri com uma toalha que tinha na entrada do necrotério, uma toalha de mão mas era grande eu botei por cima do corpo dela. Jarbas que eu conhecia muito estava também numa mesa, estava com uma zorba azul clara e tinha uma perfuração de bala na testa e uma no peito e uma mancha profunda no pescoço de um lado só como se fosse corda e com os olhos muito abertos e a língua fora da boca, que me deixou assim muito chocada, os outros corpos jaziam, um estava de bermuda que eu não conhecia, outro estava de zorba e outro despido, estavam pelo chão, todos os corpos estavam muito massacrados. Pauline tinha a boca arrebentada, tinha marcas pela testa, pela cabeça e o corpo muito marcado, então eu ao sair dali fiquei pensando como daria essa notícia a dona Rosália (mãe de Jarbas) que ainda se encontrava em minha casa justamente com Tércia e a outra filha de Jarbas que tinha apenas dez meses, eu ao chegar em casa providenciei um chá para dona Rosália e depois de muito tempo, muita conversa ela disse: “minha filha, meu filho foi assassinado com um tiro na cabeça, não foi?” fique surpresa e disse: foi, contei como estava o problema e voltei com ela ao necrotério, ela viu o corpo do filho na situação que se encontrava, então os corpos foram levados para a Várzea e posteriormente , eu sei que Jarbas foi trazido para o Cemitério de Santo Amaro, e eu não tenho certeza mas me parece que, também as estrangeiras, mas não estou bem a par disso, se elas foram removidas. Agora as pessoas que ali se encontravam sem vida era a Soledad Barret a Paulina, Eudaldo Gomes da Silva, Evaldo Luiz Ferreira que foi preso na residência de Soledad e Manoel da Silva é que foi preso no Posto de Gasolina em Toritama, a Soledad estava com os olhos muito abertos com expressão muito grande de terror, a boca estava entreaberta e o que mais me impressionou foi o sangue coagulado em grande quantidade que estava, eu tenho a impressão que ela foi morta e ficou algum tempo deitada e a trouxeram, e o sangue quando coagulou ficou preso nas pernas porque era uma quantidade grande e o feto estava lá nos pés dela, não posso saber como foi parar ali ou se foi ali mesmo no necrotério que ele caiu, que ele nasceu, naquele horror.

A Pauline eu já falei o estado que se encontrava e todos os corpos estavam muito estragados, marcas de pancadas, cortes w que me impressionou foi porque aqueles corpos estavam desnudados e todos os corpos estavam inchados, uma coisa muito impressionante ao ponto de um caixão normal não coube o corpo de Jarbas, tendo que ser feito depois um caixão a especial para que ele fosse colocado. Uma coisa que eu quero que fique esclarecida nessas minhas declarações é que eu recebi um telefonema de uma pessoa me falando que os corpos estavam no necrotério e quando eu procurei na época informações no DOPS, a pessoa me informou que estava, e que pelo o que Jarbas me falou seriamente essas prisões foram feitas pelo Cabo Anselmo e por Fleury, Jarbas me disse que ele estava na época aqui em Recife e pela violência da ação, pela barbaridade, pela crueldade , eu acredito que foi por Fleury, e Jarbas quando me disse que Fleury estava aqui ele tinha certeza e ele estava em pânico. A esposa de Jarbas permaneceu na minha casa, depois eu pedi a minha cabeleireira para cortar o cartar o cabelo dela curtinho que o cabelo era grande e ela estava de trança, é possível até que eu tenha essa trança, e ela foi maquiada, um vestido meu foi reformado para ela e ajudei-a a sair de Pernambuco juntamente com a filha, e sei que ela foi para o sul, depois foi para o exterior, eu sei que ela deixou a menina na casa da mãe dela, ela foi embora para o Rio e depois para o Chile, e depois para Cuba, a mãe dela levou a criança para companhia dela. No momento quando eu apresentei a fotografia do Daniel que Jarbas havia me dado à Comissão, a outra testemunha Sonja disse que aquele homem freqüentava com Soledad a sua casa quando ela ia levar blusas para vender em sua boutique, porque Soledade fornecia essas blusas para serem negociadas e colocadas na boutique de Sonja em consignação . Nada mais tenho à declarar.

MERCIA DE ALBUQUERQUE FERREIRA

Recife, 07 de Fevereiro de 1996.

OBS.: Depoimento prestado pela Dra. Mércia, na Secretaria de Justiça do Estado de Pernambuco, tendo como testemunha o Secretário de Justiça do Governo de Pernambuco.


 

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