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Movimento dos trabalhadores rurais sem-terra no Paraná (1986-1989)

O documento reúne uma série de informes da Polícia Militar e da Polícia Federal, além de reportagens de jornais, sobre o movimento dos trabalhadores rurais sem-terra no Paraná durante os anos de 1986 e 1989. Ele apresenta vestígiosda luta por reforma agrária em meio a um cenário de tensão entre os movimentos sociais, o Estado e os grandes proprietários de terra.

Entre 1986 e 1989, o Paraná foi palco de uma série de mobilizações protagonizadas por trabalhadores rurais sem-terra organizados em acampamentos e marchas por diversas regiões do estado. Os documentos reunidos mostram informes oficiais da Polícia Militar do Paraná e da Polícia Federal, além de recortes jornalísticos, que relatam as ações do movimento e as respostas institucionais às suas reivindicações. Os registros apontam a realização de diversas ocupações de fazendas em municípios como Castro, Telêmaco Borba, Mangueirinha, Catanduvas, Querência do Norte, Cantagalo, Guarapuava, Bituruna, entre outros, com número estimado de famílias variando entre 40 e 800 por ocupação.

Essas ações ocorreram em um contexto de grave crise agrária, marcada por promessas não cumpridas de reforma fundiária por parte do INCRA e do MIRAD. As famílias mobilizadas exigiam a desapropriação de terras improdutivas e o cumprimento de acordos firmados entre governo e movimento social, que previa o assentamento de milhares de famílias. As autoridades estaduais e federais, porém, frequentemente reagiam com repressão policial, impedimento de acampamentos e cerceamento de ações públicas dos sem-terra.

Um episódio emblemático foi a ocupação da Fazenda Lagoa, em Mangueirinha, onde a tentativa de reintegração de posse levou ao confronto direto entre policiais armados e acampados, que desarmaram e mantiveram sob custódia membros da Polícia Militar e um delegado, liberando-os após negociação. O documento também relata o uso de violência física por parte das forças de segurança, inclusive com espancamentos, e o cerco a manifestações pacíficas, como o acampamento em frente ao Palácio Iguaçu, sede do governo paranaense, onde cerca de 300 pessoas chegaram após uma marcha iniciada em Campo Largo.

Em diversas manifestações, a Igreja Católica, por meio da Pastoral da Terra, Operária e dos Favelados, além de figuras como o bispo auxiliar Dom Ladislau Biernaski, ofereceu apoio e solidariedade ao movimento, reforçando a legitimidade das reivindicações dos sem-terra. Também houve jejum coletivo na capela da Assembleia Legislativa, com adesão de padres, sindicalistas e representantes de organizações civis. Políticos como Roberto Requião e candidatos do PT e do PMDB também dialogaram com os manifestantes, enquanto o governador João Elísio Ferraz de Campos oscilava entre discursos conciliatórios e ordens de repressão.

As reportagens ainda revelam a precariedade das condições dos acampamentos: falta de alimentos, ausência de assistência médica, crianças morrendo por desidratação, e o bloqueio policial à entrada de doações. Em resposta, os sem-terra publicaram uma carta à sociedade em que reafirmaram sua autonomia organizativa, desmentiram acusações de manipulação por partidos ou entidades religiosas, e denunciaram a omissão do governo estadual e federal. Enfatizaram que lutavam por um direito constitucional: o acesso à terra para viver e produzir com dignidade.

A documentação é rica em evidências do conflito fundiário no Paraná, revelando tanto a repressão institucional quanto a crescente organização dos trabalhadores rurais. Também mostra a ampla participação da sociedade civil, imprensa e setores religiosos, num processo que fortaleceu a visibilidade do movimento dos sem-terra como ator político relevante no Brasil do final da década de 1980.

 

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