RELATO DO CASO
Em Apucarana (PR), estudou no Colégio Nilo Cairo e, em 1966, participou do grêmio da escola. Em 1968, ingressou no curso de Ciências Econômicas na Faculdade de Apucarana e foi membro da União Paranaense de Estudantes, sendo seu orador. Tornou-se delegado da UNE (União Nacional dos Estudantes) no Paraná. Era membro da Associação dos Serventuários da Justiça. Produziu programas para a rádio local, com José Idésio Brianezi, assassinado em 13 de abril de 1970. Militou na Dissidência do PCB e, em 1969, ingressou na ALN com Brianezi.
Foi indiciado no Processo 15/68 por sua participação no XXX Congresso da União Nacional de Estudantes (UNE), em outubro de 1968, na cidade de Ibiúna (SP). Dessa forma, passou a viver na clandestinidade, indo residir em São Paulo (SP). Excluído do inquérito policial 9/72, em decorrência de sua morte, que nunca foi assumida oficialmente.
Segundo o jornal Folha de Londrina, de 23 de julho de 1991:
“Em [julho de] 1973, quatro anos depois de encontrá-lo pela última vez, em Curitiba, Maria do Socorro [sua irmã] trabalhava na redação do Diário do Paraná, quando um despacho da United Press International (UPI), procedente de Washington, relacionava os nomes de 9 pessoas mortas pela ditadura brasileira, numa denúncia da Igreja Católica [segundo o livro Desaparecidos Políticos, são 19 nomes citados]. O nome do irmão constava na lista e, a partir daí, Maria do Socorro e seus familiares lutaram para buscar informações que confirmassem oficialmente a morte do estudante e recuperar seu corpo. A Polícia Federal do Paraná negou qualquer informação até que, em 76, foi divulgada nova lista de mortos pela repressão que relacionava Três Reis. Porém, mesmo com a ajuda de entidades que trabalhavam em busca de identificar os desaparecidos, não tiveram sucesso”.
De posse do documento, procurou a delegacia da Polícia Federal do Paraná, para saber sobre a procedência da informação. O general Alcindo Gonçalves e seu assessor disseram-lhe que nada havia contra Antônio naquela repartição, somente encontraram registros sobre sua prisão em Ibiúna. A família chegou a publicar um anúncio com sua foto, procurando-o, em dois jornais de circulação nacional, o Jornal do Brasil e o Última Hora. Os jornais O Estado de S. Paulo e o Jornal do Brasil, de 5 de abril de 1978, divulgaram uma relação de nomes assinada pelo Comitê Brasileiro de Anistia em que Antônio figurava como desaparecido. Em 18 de abril de 1978, Dia Nacional de Protesto organizado pelos estudantes do Rio de Janeiro, nova indicação de sua morte foi divulgada. Pouco depois, a pedido da família, o bispo da Diocese de Apucarana celebrou uma missa na catedral, em memória de Antônio, quando compareceram cerca de 200 pessoas.
Nos arquivos do DOPS/SP foi encontrado um documento intitulado “Aos Bispos do Brasil”, de fevereiro de 1973, assinado pelo Comitê de Solidariedade aos Presos Políticos do Brasil, em que Antônio dos Três Reis de Oliveira é citado na lista dos “casos de combatentes sumariamente executados” (documento 30-Z-160-11691).
Depoimento dos presos políticos de São Paulo denunciou a morte desses dois militantes por agentes da OBAN, chefiados pelo capitão Maurício Lopes Lima (CEMDP, p.128). Seu laudo necroscópico, encontrado nos arquivos do IML/SP em 1990, refere-se a um único tiro no olho direito e foi assinado pelos médicos legistas João Pagenotto e Abeylard Queiroz Orsini. De acordo com a documentação encontrada nos arquivos do IML/SP, o delegado do DOPS Alcides Cintra Bueno Filho determinou que seu corpo somente fosse enterrado após autorização do órgão.
No relatório do Ministério da Aeronáutica, encaminhado ao ministro da Justiça em 1993, consta que “[…] faleceu em 17 de maio de 1970, em Taubaté, [sic] SP, quando uma equipe de segurança procurava averiguar a existência de um provável aparelho, o que resultou na sua morte”. Assim mesmo continuaram a omitir a informação sobre o seu paradeiro à sociedade e aos seus familiares.
Apenas com a abertura dos arquivos do DOPS/PR, em 1991, foi possível encontrar dados sobre a morte e o local onde Antônio dos Três Reis foi enterrado. Seu nome foi encontrado em uma gaveta com a identificação “falecidos”, onde constava que fora enterrado como indigente no Cemitério de Vila Formosa, na capital paulista, em 21 de maio de 1970.
Em 10 de dezembro de 1991, com a presença de seus familiares, a equipe de técnicos da Unicamp, a Comissão Especial de Investigação das Ossadas de Perus e a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos tentaram a exumação de seus restos mortais, que não foram encontrados. Constatou-se que a quadra onde Antônio deveria estar enterrado e pelo menos mais outros dois presos políticos (Alceri Maria Gomes da Silva, assassinada na mesma ocasião, e Antônio Raymundo Lucena, assassinado em Atibaia (SP), em 20 de fevereiro de 1970), sofreu profundas alterações. Segundo os coveiros daquele cemitério, em 1976 houve exumações no momento da alteração da quadra e as ossadas foram jogadas em algum lugar do cemitério não informado.
Seu nome consta no anexo I da Lei 9.140/95. Na CEMDP seu caso foi protocolado com o nº 068/96.
Fontes investigadas:
Conclusões da CEMDP; Dossiê Ditadura – Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil – 1964-1985, IEVE.
IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES DA MORTE\DESAPARECIMENTO
Órgão / Período | Nome | Função | conduta | Vivo/data do óbito | Observações |
Destacamento de Operações de Informações- Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi)/ OPERAÇÃO BANDEIRANTES (OBAN) 1969/1971 | Mauricio Lopes Lima | Chefe de equipe de busca e orientador de interrogatórios no DOI-Codi/OBAN | Assassinato | Depoimento dos presos políticos de São Paulo denunciou a morte desses dois militantes por agentes da OBAN, chefiados pelo capitão Maurício Lopes Lima Informação consta nas Conclusões da CEMDP, p.128. | |
Departamento Estadual de Ordem e Política Social (DOPS) 1969-1975 | Alcides Cintra Bueno | Delegado | Falsa versão da morte da militante, desaparecimento forçado e ocultação de cadáver | Assina a Requisição de Exame encaminhado pelo DOPS ao IML. Ver anexo 009 | |
Instituto Médico Legal | João Pagenotto | Médico-legista | Falsificação do Laudo de Exame de Corpo de Delito | Ver anexo 001 (p. 11-12) | |
Instituto Médico Legal | Abeylard Queiroz Orsini. | Médico-legista | Falsificação do Laudo de Exame de Corpo de Delito | Ver anexo 001 (p. 11-12) |
DOCUMENTOS CONSULTADOS
- Documentação principal
Identificação do documento | Órgão da repressão | Observações | Anexo |
Dossiê para Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) | Documento encaminhado à Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos por Maria do Perpétuo Socorro de Oliveira Macário da Cruz e Baltazar Eustáquio de Oliveira, irmão de Antonio dos Três Reis de Oliveira, no dia 23/01/1996 | 001-dossie_cemdp.pdf | |
Certidão de óbito falsa | Certidão de óbito falsa assinada pelo Dr. João Pagenotto | 001-dossie_cemdp.pdf (p. 3) | |
Relatório dos Ministérios dos Militares entregues ao deputado Nilmário Miranda, presidente da Comissão Externa da Câmara, em 1993 | No relatório do Ministério da Aeronáutica, encaminhado ao ministro da Justiça em 1993, consta que “[…] faleceu em 17 de maio de 1970, em Taubaté, [sic] SP, quando uma equipe de segurança procurava averiguar a existência de um provável aparelho, o que resultou na sua morte”. | 004-relatorio_aeronautica.pdf | |
Foto Antonio dos Três Reis de Oliveira | 005-foto_antonio.jpg | ||
Certidão | Departamento da Polícia Civil do Estado do Paraná/ Divisão de Segurança e Informação | Certifica que a ficha de Antonio foi encontrada na Delegacia de Ordem Política e Social (Dops) do Paraná no arquivo de aço plaqueta G.2-1178 em um gaveta com a seguinte identificação: “falecidos” | 007-certidao_dops_gaveta_falecidos.pdf |
Carta aos Bispos do Brasil, de fevereiro de 1973, assinado pelo Comitê de Solidariedade aos Presos Políticos do Brasil. | Nos arquivos do DOPS/SP foi encontrado um documento intitulado “Aos Bispos do Brasil”, em que Antônio dos Três Reis de Oliveira é citado na lista dos “casos de combatentes sumariamente executados” (documento 30-Z-160-11691).
|
009-carta_aos_bispos_brasil.pdf |
- Prova pericial e documental (inclusive fotos e vídeos) sobre a morte/desaparecimento
Documento | Fonte | Observação | Anexo |
Laudo de exame de corpo de delito | Instituto Médico Legal | 001-dossie_cemdp.pdf (p.11-12) | |
Ficha dados físicos de Antonio dos Três Reis de Oliveira | 002-dados_fisicos.pdf | ||
Ficha Dactiloscópica | Departamento Estadual de Ordem e Política Social (DOPS) | 003-ficha_dactiloscopica.pdf | |
Foto Antonio dos Três Reis de Oliveira morto | 006-foto_antonio_morto.jpg | ||
Requisição de Exame | Instituto Médico Legal | 008-documentos_perseguicao_antonio.pdf (p.18-20) |
3. Testemunhos sobre a prisão, morte/desaparecimento
Nome | Relação com o morto / desaparecido | Informação | Fonte |
4. Depoimento de agentes da repressão sobre a morte/desaparecimento
Nome | Órgão / Função | Informação | Fonte com referências |
OBS: Em anexo cópias de todos os documentos reunidos pela Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos e Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO
Conclusão: Antonio dos Três Reis de Oliveira é considerado desaparecido político, por não ter sido entregue os restos mortais aos seus familiares, não permitindo o seu sepultamento até os dias de hoje. Conforme o exposto no parágrafo 103 da Sentença da Corte Interamericana no Caso Gomes Lund e outros: “adicionalmente, no Direito Internacional, a jurisprudência deste Tribunal foi precursora da consolidação de uma perspectiva abrangente da gravidade e do caráter continuado ou permanente da figura do desaparecimento forçado de pessoas, na qual o ato de desaparecimento e sua execução se iniciam com a privação da liberdade da pessoa e a subseqüente falta de informação sobre seu destino, e permanece enquanto não se conheça o paradeiro da pessoa desaparecida e se determine com certeza sua identidade (…)”.
No parágrafo 110 do mesmo documento é mencionado que: “(…) pode-se concluir que os atos que constituem o desaparecimento forçado têm caráter permanente e que suas conseqüências acarretam uma pluriofensividade aos direitos das pessoas reconhecidos na Convenção Americana, enquanto não se conheça o paradeiro da vítima ou se encontrem seus restos, motivo pelo qual os Estados têm o dever correlato de investigar e, eventualmente, punir os responsáveis, conforme as obrigações decorrentes da Convenção Americana”. (Sentença da Corte Interamericana, p. 38 e 41, publicação da Comissão Estadual da Verdade de São Paulo).
Recomendações: Investigação das circunstâncias da morte e desaparecimento de Antonio dos Três Reis de Oliveira; localização dos restos mortais; Retificação e indicação da causa mortis no atestado de óbito; responsabilização dos agentes da repressão envolvidos no caso; Que o Estado brasileiro reconheça e declare a condição de anistiada política de Antonio dos Três Reis de Oliveira pedindo oficialmente perdão pelos atos de exceção e violações de direitos humanos que foram praticados contra esse desaparecido político.
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