Jorge Medeiros Valle, bancário carioca, é um dos personagens mais controvertidos da esquerda que optou pela luta armada durante o regime militar. S
ua história virou filme, cujo nome intitula a coluna, estrelado pelo falecido ator José Wilker, uma versão glamourizada de sua vida, que mais tarde foi desnudada na dissertação de mestrado da professora Valesca de Souza Almeida. Funcionário do Banco do Brasil, Valle foi preso em julho de 1969, quando os órgãos de segurança do regime militar descobriram que ele havia desviado 2 milhões de cruzeiros novos da agência em que trabalhava, para financiar organizações clandestinas dedicadas à luta armada contra a ditadura militar.
O “Bom Burguês”, como ficaria conhecido, cumpriu pena de seis anos na Ilha das Flores. Foi condenado novamente em 1975, mas exilou-se no México com a sua família, a fim de escapar de uma nova temporada no cárcere. Embora a sua trajetória tenha pontos em comum com a de outros militantes da luta armada, tinha um perfil completamente distinto dos jovens que haviam optado por pegar em armas na clandestinidade. Manteve a aparência de vida normal para um burocrata. A partir da sua entrada para o Banco do Brasil, em 1952, atuou como sindicalista, chegando a pensar em se candidatar a presidente do Sindicato. Depois do golpe militar de 1964, porém, afastou-se do sindicato e ligou-se ao PCBR, uma dissidência do antigo PCB liderada pelos dirigentes comunistas Mario Alves, assassinado na prisão em janeiro de 1970, e Apolônio de Carvalho, que mais tarde viria a ser um dos fundadores do PT.
Como exercia uma função subalterna no banco, mas de confiança dos gerentes na compensação bancária, arquitetou um plano simples para desviar dinheiro para a guerrilha urbana. Abria contas em pequenos bancos e emitia cheques na agência em que trabalhava para essas contas. Quando o cheque chegava na compensação, ele não debitava a agência, mas trocava o cheque falso, que destruía, por uma ordem de pagamento, que ele mesmo recebia. Ou seja, através da ordem de pagamento que substituía o cheque falso, fornecia um crédito a ele mesmo, recebido em outro banco, fazendo com que a operação gerasse uma dívida para o Banco do Brasil.